Entrevista à CAP e os comentários da Prof. Margarida Silva - OGM

Entrevista da CAP sobre os OGM
(comentada pela Prof. Margarida Silva, Universidade Católica, Porto)
ler em

Entrevistador - Mudando de assunto, qual é a posição da CAP sobre os organismos geneticamente modificados (OGM)?

João Machado, presidente da CAP - O que a CAP diz e tem defendido, e
eu próprio, que sou administrador da Autoridade da Segurança Alimentar Europeia - a autoridade que diz se são perigosos ou não os OGM -, é o seguinte: os agricultores portugueses, e os europeus (porque isto são directivas comunitárias), não são cientistas. Não se têm que pronunciar sobre se é um perigo para a biodiversidade, para a saúde humana, para o que quer que seja. Para isso, existe uma Autoridade da Segurança Alimentar, que diz se é perigoso ou não.

Comentário de Margarida Silva (MS) - Mesmo que os OGM fossem seguros para a saúde das pessoas e do planeta, ainda assim seriam um mau negócio para todos nós
por exemplo graças às patentes e à privatização do património biológico - e este problema todos podem entender sem serem especialistas em engenharia genética. Mesmo que os OGM fossem seguros, os cientistas não conseguiriam provar que
o risco era zero e por isso é sempre preciso partir do princípio que existe risco. E, se há risco, o público, que é quem vai arcar com as suas consequências, tem de ser
envolvido na decisão. A ciência nunca vai poder decidir por nós, impor qual é o risco que é aceitável para a sociedade. Por outro lado, a simplificação que João Machado
faz é bastante conveniente: permite que uma instituição supostamente imparcial (mas longe de o ser) açambarque o poder de decisão e imponha a sua visão da agricultura e da alimentação a toda a sociedade sem que possa haver recurso, uma vez que o público não cientista fica excluído à partida e nem precisa de ter opinião.)

João Machado, presidente - A Autoridade da Segurança Alimentar Europeia licenciou
unicamente, até ao momento, algumas variedades de milho de OGM. Não licenciou mais nada.

Comentário - Duas frases, dois erros crassos. A Autoridade de Segurança Alimentar não licencia. Quem faz
isso é a Comissão ou os Estados-Membros. A Autoridade limita-se a dar o parecer científico. Além disso, ainda em 24 de Outubro de 2007 foi aprovada uma beterraba transgénica, naturalmente com parecer positivo da Autoridade (dado em 2006).
Por isso a Autoridade não tem deixado passar só o milho.
Como Administrador, João Machado devia saber melhor o que anda a dizer - assumindo que o que está escrito não foi alterado pelo jornalista e corresponde realmente ao que ele disse.)

João Machado, CAP -Nessa matéria, em primeiro lugar, a CAP o que diz é o
seguinte: cientificamente, tem que estar provado que os OGM não têm problema nem para a saúde humana, nem para a saúde animal, nem para a biodiversidade. Uma vez dito por uma autoridade nesta matéria que assim é, nós não vemos porque é que não poderemos cultivar. Porquê? Porque, em primeiro lugar, estamos ao lado dos nossos colegas agricultores americanos ou brasileiros, que todos os dias produzem OGM.

Comentário MS - Até parece que JM nunca pensou nas leis
do mercado. O consumidor tem sempre razão! Mesmo que esteja autorizado, para quê produzir o que ninguém quer comer?
Para quê limitar o direito à informação (por exemplo, impedindo a rotulagem dos produtos animais sobre que rações foram usadas) e tentar empurrar OGM contra a vontade da esmagadora maioria dos cidadãos? Acaso isto é que é o mercado livre? Que raio de democracia é esta em que as pessoas não se podem recusar a comer certos rodutos???)

João Machado, CAP - Em segundo lugar, normalmente são sementes resistentes a determinado tipo de praga, o que obriga a que se utilize menos pesticidas. São mais amigas do ambiente.

Comentário MS - As culturas Bt, de que JM fala, são minoritárias. Muito mais de metade dos OGM cultivados no mundo são resistentes a herbicidas, o que permite precisamente que o produtor use mais químicos tóxicos, e que leva a que o consumidor coma mais desses resíduos. E no caso das culturas Bt, João Machado parece acreditar no ilusionismo. O produtor aplica menos insecticidas, de facto, mas apenas porque a planta já os está a produzir. Por isso, em termos de contaminação ambiental, não há melhoria nenhuma (antes pelo contrário, mas isso é outra história.))

João Machado, CAP - Em terceiro lugar, normalmente são sementes que utilizam menos
água e requerem menos matéria-prima do que as normais.

Comentário MS - ".." Não existe nenhum OGM comercial em lugar nenhum do mundo que tenha qualquer uma destas características. Talvez no futuro... que já nos anda
a ser prometido há mais de uma década e não se sabe em que manhã de nevoeiro irá aparecer.)

João Machado, CAP - Portanto, uma vez estudado por cientistas e dito que não tem
problemas, nós achamos que temos o direito de estarmos nas mesmas condições que os nossos colegas do resto do mundo.
Até estar provado por cientistas que não faz mal, nós somos defensores daquilo a que a Europa chama 'princípio da precaução'. Até lá, nós achamos que não devemos utilizar.

Comentário - Esta afirmação de JM mostra que ele deve
escolher bem os colegas com quem fala - certamente não serão os agricultores argentinos expulsos das suas terras por causa da expansão da soja transgénica, nem os americanos forçados a vender as quintas e a mudar de profissão porque
não conseguem viver da agricultura, nem os canadianos arrastados ao tribunal por terem sido contaminados com transgénicos... Quem serão os colegas afinal? Por outro
lado, acho bem que ele goste de precaução e não use o que é (ainda) ilegal. Mas ele devia dar uma palavrinha aos seus amigos das rações, e da Nestlé, a ver se não andam
sempre a pedir que aprovem OGM em catadupa, e a tentar convencer-nos de que sem OGM vem aí uma catástrofe.
Aliás, o que eles agora querem é precisamente que passe a ser legal a entrada de OGM ainda não aprovados. Mas claro que é "só um bocadinho" e nem vai doer nada.)

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