Os alemães e Boaventura Sousa Santos
Caro prof. Boaventura Sousa Santos,
Há anos que leio os seus artigo. Concordo, muitas vezes com as suas análises
e juízos de valor, outras vezes discordo.Foi com surpresa que li a 04 de
maio, no Público, um texto seu intitulado "Diktat alemão", uma peça faciosa, algo ignorante e "proto-racista" sobre os alemães e a Alemanha.
Utilizar
a expressão “Diktat alemão” é promover a ideia de que a Alemanha de hoje é a
mesma de 1914 ou de 1939.
Isto é absolutamente falso e ridículo, e revela uma atroz ignorância sobre a
forma como a Europa e a Alemanha são governadas. As citações que faz de Fichte
(de 1807....), o "pai" de nacionalismo alemão, são equivalentes a citar intelectuais portugueses do seculo XIX
sobre a alma esclavagista portuguesa e a "nossa propensão inata a dominar e
escravizar os outros povos". Mas o maior disparate de todos vem no fim, ao
contrário do que afirma, não há nenhum outro país no mundo que preserve e
divulgue, tanto Escola como na TV (nacional e pública) os seus próprios crimes recentes, datados de há mais de 60 anos.
O
prof. Sousa Santos agarra-se a um inquérito realizados aos jovens (uma árvore
na floresta) para demonstrar sociologicamente que o racismo alemão e o
“esquecimento coletivo sobre Dachau, Buchenwald, Auschwitz” são o objetivo do
governo alemão ! Se isto é obra de um
sociólogo, então, somos todos sociólogos.
Proponho-lhe
agora a leitura do seguinte texto (em itálico):
“
A razão portuguesa tem um lastro de predestinação divina que António José Seixas, o maior perito português em questões coloniais definiu bem em 1850, quando contrapôs o português ao estrangeiro
desta forma: o português está para o estrangeiro como o espírito está para a
matéria, como o bem está para o mal. Perante isto, qualquer transigência é
sinal de fraqueza e de inferioridade. O próprio direito tem de ceder à força
para que esta não enfraqueça.
Quando,
no começo da “era colonização moderna”, Portugal invadiu e destruiu culturas e
civilizações, sob o pretexto falso de se defender dos "pretos", violou todos os
preceitos éticos, dada o pacifismo dos países
(as agressões portuguesas tendem historicamente a tomar como alvo
inicial os países mais fracos). Sem qualquer escrúpulo, o rei português
declarou "A ilegalidade que
praticámos havemos de procurar reparar logo que tivermos atingido o nosso
escopo militar. Quando se é ameaçado e se luta por um bem supremo, cada qual
governa-se como pode".
Esta
arrogância não exclui alguma magnanimidade, desde que as vítimas se portem bem.
Caso contrário, sofreriam sem dó nem piedade. Como sabemos algumas tribos,
decidiram não ser bons alunos e pagaram por isso o elevado preço da destruição
e dos massacres, uma agressão vil.
Dada
esta superioridade humilhar a arrogância portuguesa tem sempre envolvido muita
destruição material e humana, tanto dos povos vítimas dessa arrogância como do
povo português. Claro que a história nunca se repete e que Portugal é hoje um
país sem poder militar e governado por uma vibrante democracia. Mas três factos
perturbadores obrigam os países africanos a tomar em conta a história. Em
primeiro lugar, é perturbador verificar que o poder económico português está
hoje convertido em fonte de uma ortodoxia que beneficia unilateralmente
Portugal, ao contrário do que se quer fazer crer.
Também
agora se pretende convencer os africanos de que o colonialismo português era
para seu bem, "um dever imperioso de conservação dos valores"
Em
segundo lugar, são perturbadoras as manifestações de preconceito racial em
relação aos países africanos na opinião pública portuguesa.
Vem
à memória o terceiro facto perturbador. Um inquérito realizado há pouco mais de
um ano aos alunos das escolas secundárias portuguesas (entre 14 e 16 anos de
idade) revelou que um terço não sabia quem fora Salazar e que 40% estavam
convencidos de que os direitos humanos tinham sido sempre respeitados pelos
Governos portugueses desde 1926.”
Reconhece o "seu texto" ?
Cumprimentos,
João
Vaz
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